quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

"SE EU TE ESQUECER, JERUSALÉM ..."



Presidente da CENAPET fala sobre a ofensiva israelense em Gaza:

Redação: Professor, sabemos que o Sr. residiu em Israel durante os anos 90. Qual sua impressão sobre a guerra que flagela a faixa de Gaza? Poderia nos falar sobre isso?

M.C.D.N: Entre 1991 e 1992 fiz um curso de especialização em Educação para a Ciência em Israel, hospedado num kibutz em Jerusalém, na fronteira da Cisjordânia Ocupada. Da colina do kibutz, podíamos ver Belém e toda a Jerusalém. Ao redor da edificação haviam trincheiras de três guerras: da libertação dos ingleses, dos 6 dias e do Yom Kippur. Muitas das terras ainda estavam minadas. Pela estrada, esqueletos de tanques e carros armados atestavam quase cinco décadas de extrema violência.
Fui para lá somente seis meses após a primeira guerra do Iraque, quando Saddam bombardeou Jerusalém e Tel Aviv com vários mísseis Scuds, e logo após a primeira Intifada tanto na Cisjordânia quanto na Faixa de Gaza.
Durante o período que lá permaneci conversava tanto com israelenses quanto com palestinos. Encontrei ali os vários matizes humanos (de ambos os lados): do moderado aos radicais judeus e palestinos. Um exemplo deste último grupo foi um motorista que orava durante a guerra do Iraque que um Scud aniquilasse a parte judaica de Jerusalém. Disse que aquilo poderia matá-lo também. A resposta: “não importa, seria para um bem maior”. Do outro lado do extremismo, conversei com extremistas judeus, do bairro de Mea Shearim, que sequer reconheciam o próprio Estado de Israel (que deverá ser reconhecido, para eles, quando retornar o Messias). Queriam o crescimento dos assentamentos judeus em terras palestinas.
Espremidos entre estes dois radicalismos, os moderados falavam de um Estado compartilhado com a capital Jerusalém co-administrada.
Porém, as vozes de uma guerra santa, por Alá ou por um Messias desconhecido eram mais retumbantes.
Da colina do Kibutz fitava a linha do horizonte, onde se encontravam as ruínas do Herodium, um antigo palácio romano de época anterior a Cristo. Queria visitá-lo, mas o turismo ali era proibido por ser na Cisjordânia e pelo perigo da Intifada. Resolvi, eu e mais um colega, cobrir à pé os 30 km que separavam o kibutz das ruínas. Encontramos palestinos, pastores de cabras e cultivadores de oliveiras em todo trajeto, assim como soldados israelenses em jipes militares.
Fomos saudados por todos, com olhos curiosos. Pelo caminho, fui recolhendo cápsulas não disparadas de fuzis e metralhadoras e um ôbus de guerra detonado.
O material serviu para a confecção de uma pequena escultura, “Mãe com a criança morta”, baseado no quadro Guernica de Pablo Picasso, que, posteriormente foi doada ao Centro Aharon Ofri do Ministério de Relações Exteriores de Israel.
Após todo esse período, dirigi-me de ônibus de linha para o Egito passando pela Faixa de Gaza na Fronteira de Raffah. Pela estrada, dezenas e dezenas de crianças palestinas reduzidas à mendicância. Os ônibus, em comboio, protegidos à frente e à retaguarda por veículos militares israelenses escoltaram-nos até a fronteira egípcia.
Da experiência, restou a forte impressão que muitas guerras e milhares de mortes ainda ocorrerão para descobrir que, ao final, todos gostariam de viver em paz como bons vizinhos, como bons amigos, divididos tão somente por uma ideologia que deveria colorir a vida e não aniquilá-la para sempre.

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